domingo, 13 de outubro de 2013

Qual o seu nome?

Ela acordou como se o ontem não houvesse existido. Tomou café, escovou os dentes, leu os jornais. Decidiu não ir à aula. Decidiu não ver pessoas. Escondeu-se no cobertor, assistiu filmes e passou esse dia assim.
No outro dia, ela acordou como se a semana não houvesse passado. Escreveu dois poemas de cinco estrofes sobre a luz do sol. Tomou chá e rezou. Era um dia de domingo anormal.
Dia seguinte era uma quinta e precisava ir para a aula. Mas o domingo se prolongou por mais algumas semanas.
Arrumou o quarto em uma sexta, descobriu onde havia perdido um livro que lera na infância. Resolveu relê-lo, mas parou na oitava página. Resolveu esquecer sua infância também. Esquecer não. Tal época nunca existiu.
Achou o celular jogado nas roupas sujas do banheiro na madrugada de sábado. Nada de novo, realmente não tinha esperanças que alguém a ligasse. Nenhuma esperança mesmo. Até decidiu que esperança era apenas uma palavra sem significado.
No domingo saiu de casa. Foi para um bar à noite. Onde encontrou vários amigos. Sarah e Fred. Eles acenaram de longe e disseram que já estavam de saída. Ela também estava, mas eles iam para um lado totalmente contrário ao dela. Apesar de ela saber que a casa deles não era para aquele lado, sorriu e pegou um ônibus.
No ônibus, haviam quatro pessoas. O motorista, o trocador, um homem e ela. O homem sentou-se ao lado dela e anunciou um sequestro. Sem querer ela deu uma risada e levou um tiro. O motorista quis parar o ônibus no desespero, mas o homem mandou continuar a dirigir o automóvel. O trocador olhava para a cena espantado, só pensava nos seus filhos (que ainda não tinha) e na sua mulher (a mulher do restaurante que não cobrou os 10%).
Ela sangrava. Sentia um prazer diferente. Um alívio. Era entorpecente o terror que sentia.
O homem estava assustado por ela não parar de sorrir. Era o pior sorriso que ele já havia visto. Ele identificou como o sorriso que sua mãe deu quando ele tinha 10 anos e perguntou pelo paradeiro de seu pai. Apesar de sua mãe não ter sorrido de fato.
Ela sentiu algo estranho querer subir por sua garganta e relembrou de fatos inexistentes da infância. Lembrou do Francisco. Um homem que, segundo ela, deveria ter levado um tiro em seu lugar.
Vomitou sangue e riu novamente. Ela não pensava em muita coisa. Mas lembrou dos dias que não existiram. Do amor que nunca teve. Dos amigos que moravam longe e da família que não havia morrido, mas participava da sua vida.
Decidiu esquecer tudo. O ônibus estava girando morro abaixo.
O último barulho que ela identificou, mesmo que com dificuldade, foi o do seu celular tocando.
Ela deu o último sorriso de prazer da semana. Mesmo que sua cota de sorrisos diários já houvessem se extrapolado.

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